As legendas dos Santos Jorge da Capadócia e Cipriano de Antioquia: relíquias da controvérsia arriana (325-381 d.C.)
Abstract
O historiador inglês Edward Gibbon, em seu clássico A história do declínio e queda do Império Romano, provocou certa discussão no interior da academia inglesa do final do século XIX ao afirmar que o mártir, santo e herói cristão Jorge da Inglaterra devia ser identificado com Jorge da Capadócia, bispo de Alexandria entre 356 e 361 d.C., ano de sua morte por linchamento. Jorge foi vítima da “controvérsia arriana”, uma disputa teológica sobre a natureza de Cristo que acirrou os ânimos de orientações doutrinárias adversárias: para os “arrianos”, como Jorge e o então imperador Constâncio, Cristo era uma criatura, por meio de quem o Pai fez as outras criaturas existirem; para os “trinitaristas”, como Atanásio de Alexandria, o Filho era partícipe de uma Trindade, três “realidades subsistentes” (hypostaseis) de uma mesma substância (homoousios, “consubstancial”). Desenvolvo, neste trabalho, uma solução que concilia a hipótese de Gibbon àquela de seus críticos, segundo quem o nome Jorge já estava associado a um santo mártir anterior à emergência histórica do bispo arriano. Com base em outra legenda, tão antiga quanto a de são Jorge – a dos santos Cipriano e Justina de Antioquia – apresento evidências de que, durante a controvérsia do século IV, a tradição hagiográfica do “santo-bruxo” da Síria foi apropriada não apenas pelo partido arriano, tal qual fizeram com a legenda de são Jorge da Capadócia, mas também pelos adversários trinitaristas. A chave para a conexão entre os documentos e a propaganda partidária é o “feiticeiro Atanásio”, personagem que é citado em determinadas versões das duas legendas. A despeito de ter existido um santo mártir homônimo, como quiseram os críticos de Gibbon, concluímos que, são Jorge da Capadócia pode, de fato, ser identificado, a partir da segunda metade do século IV, com o bispo arriano.Downloads
DECLARAÇÃO DE ORIGINALIDADE E DIREITOS AUTORAIS
Declaro que o presente artigo é original, não tendo sido submetido à publicação em qualquer outro periódico nacional ou internacional, quer seja em parte ou em sua totalidade.
Os direitos autorais pertencem exclusivamente aos autores. Os direitos de licenciamento utilizados pelo periódico é a licença Creative Commons Attribution 3.0 (CC BY 3.0): são permitidos o acompartilhamento (cópia e distribuição do material em qualqer meio ou formato) e adaptação (remix, transformação e criação de material a partir do conteúdo assim licenciado para quaisquer fins, inclusive comerciais.
Recomenda-se a leitura desse link para maiores informações sobre o tema: fornecimento de créditos e referências de forma correta, entre outros detalhes cruciais para uso adequado do material licenciado.