A Antiguidade como ferramenta colonial

os usos do passado na criação do Projeto do Mar Interior do Saara

  • Heitor dos Santos Rodrigues Universidade Federal do Paraná

Resumen

Este artigo analisa os usos do passado no projeto de criação do Mar Interior do Saara, idealizado por François Élie Roudaire entre 1874 e 1885. O objetivo era transformar os chotts (lagos salinos) do sul da Tunísia e Argélia em um novo mar, alterando o clima local para favorecer a agricultura e a expansão comercial, de modo a facilitar o assentamento de colonos europeus. Argumenta-se que o projeto foi influenciado por uma corrente de geógrafos, militares e exploradores interessados nas fontes clássicas, em especial, na menção de Heródoto ao Mar Tritão, que supostamente teria existido na região dos chotts. Roudaire analisou outras fontes históricas para comprovar esse mito, a partir da ideia de que sua proposta fosse uma restauração da antiga natureza do Saara. Defendia-se que esse espaço havia sido contemplado na Antiguidade, principalmente na ideia do celeiro de Roma, graças ao modelo de civilização que proporcionaram. A posterior ocupação muçulmana teria interrompido esse processo, contribuído para a degradação ambiental e ampliado a desertificação. Os franceses, que se viam como herdeiros da Roma antiga, imaginaram recriar esse cenário. Entretanto, Roudaire e seus contemporâneos enfrentaram dificuldades para conciliar os novos dados geográficos e geológicos com as fontes históricas, refletindo as transformações disciplinares em curso e o fascínio europeu pela Antiguidade. Desse modo, as fontes clássicas serviram como instrumento de legitimação de um empreendimento colonial. O vínculo histórico reforçava a narrativa de que o Saara já foi (e poderia voltar a ser) um espaço de civilização.

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Publicado
2025-11-19
Cómo citar
DOS SANTOS RODRIGUES, H. A Antiguidade como ferramenta colonial. Revista de História: 29 de abril, v. 5, n. 9, p. 103-124, 19 nov. 2025.