Apresentação do dossiê “Feminicídio em tempos de Covid-19”

  • Brenna Galtierrez Fortes Pessoa Universidade Federal do Piauí
  • Elaine Ferreira do Nascimento Fiocruz Piauí
Palavras-chave: Covid-19, Dossiê, Feminicídio

Resumo

O assassinato de mulheres é um fenômeno social marcado historicamente pela desigualdade de gênero e o ódio ao ser feminino por aqueles que figuram como ser masculino em suas vidas, conforme revela os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) de 2019, que diz que o principal algoz das mulheres em 88,8% dos casos é um homem com quem a vítima possui ou possuía laços afetivos, podendo ser consanguíneos ou não, por isso a justificativa para o reconhecimento do termo feminicídio. No Brasil, transformou em projeto de lei, sendo promulgado em 9 de março de 2015, com a Lei n°13.104/15 ou Lei de Feminicídio, sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff do Partido dos Trabalhadores (PT), enquanto resposta para os elevados índices deste crime fatalista.

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) do ano de 2019 também revelou o aumento de feminicídio em comparação ao ano de 2018, com uma escalada crescente de 7,3% com cerca de 1.314 mulheres mortas pela sua condição de gênero feminino, uma a cada 7 horas, em média. Outros relatórios estatísticos já revelaram os demais possíveis agravantes, que causam diferenças exponenciais entre as mulheres vitimadas por este crime. Conforme o Altas da Violência de 2019 a porcentagem de assassinatos de mulheres negras vítimas pelo feminicídio é de 66% em relação ao universo total de mulheres (incluindo as não negras), mostrando assim que a violência não tem só gênero, mas também cor, e quando são pobres esta condição triplica, pois há estudos que comprovam que quanto maior são as desigualdades raciais e social de um país mais chances ocorrerem este e outros tipos de crimes.

            Como mostra o próprio Altas da Violência em parceira com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) de 2018, que diz que das dez cidades com maiores números de assassinatos no país, tem nove vezes mais pessoas na extrema pobreza do que aquelas com os menores índices de violência, outro ponto a ser levado em consideração é que de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) de 2019, retratou que são a população negra os correspondentes aos 75% mais pobres e os brancos os 70% mais ricos do Brasil, portanto neste universo que inclui as mulheres negras que são pobres, essa possibilidade de violência triplica (lê-se gênero, raça e classe), por isso que muitos pesquisadores advogam para que os estudos de políticas públicas de combate ao feminicídio seja perpassada pela perspectiva da  interseccionalidade (raça, classe e gênero), conceito este  formulado por Patrícia Hills Collins, como um eixo estruturante na formulação das políticas para as mulheres.

Uma dessas pesquisadoras é a demógrafa Jackeline Romio e a antropóloga Rita Laura Segato, que defendem aprofundamento desta temática, por este viés no âmbito das políticas públicas a fim de combater tal problemática (lê-se feminicídio), pois como diz a autora Carla Akotirene em seu livro intitulado de “Interseccionalidade” vivemos em um país que tem como valores fundantes o contexto do colonialismo, do racismo e do capitalismo, na qual causam grandes disparidades tanto racial como social percebido em dados, bem como do usufruto da necropolítica do filósofo camaronês Achille Mbembe enquanto base analítica para entender como apesar de termos tantas mortes contínua e crescentes de mulheres não brancas vítimas de feminicídio, ainda não há a realização de políticas públicas urgentes pelo Estado, com base neste conceito interseccional atrelada ao crime.

            Nisso, Romio e Segato são incisivas nas conclusões dos seus estudos, de atribuir a responsabilidade ao Estado neste cenário, ao dizerem que não é preciso só coibir e punir o crime por motivos de gênero, mas também é preciso torná-los visíveis as outras raízes discriminatórias (raça e classe), que o agravam, entre as mulheres, aumentando anualmente por conivência ao poderio do status quo perpetrados não só pelo patriarcado, mas também de forma imbricada pelo colonialismo, racismo e pelo capitalismo, que juntos atuam enquanto eixos fundantes. Portanto no Brasil, para se ter uma política pública eficaz de proteção e de enfrentamento a violência contra a mulher deve-se ir para além da compreensão de gênero.

  Um assunto que entrou em pauta neste ano de 2020, foi sem dúvida, à pandemia de covid-19 enquanto tema de saúde pública e social a ser enfrentada, na qual perpassa na vida de todos sem restrições, mas aqui o destaque será para as mulheres, que devido alta carga de contagio da doença viral, medidas necessárias foram sancionadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como do isolamento social dentro dos lares, que fazem com elas sofram riscos eminentes de serem mortas, ao estarem no espaço privado de forma integral com seus agressores, dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2019, apontam que 65,6% dos assassinatos de mulheres foram realizados em domicílio, em decorrência disso, os pesquisadores do FBSP, já afirmaram aguardar pela crescente do crime fatalista este ano, com um aumento de pelo menos 46,2% dos números de casos de feminicídio, ocasionado por esta medida.

Neste sentido, o nosso grupo de pesquisa denominado “AFRO-IBERO LATINO AMERICANO DE FEMINICÍDIO”, liderado pela Dra. Elaine Ferreira do Nascimento, professora do quadro permanente da Universidade Federal do Piauí e coordenadora adjunta da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ-PI) e Brenna Galtierrez Fortes Pessoa, pesquisadora júnior. O grupo está em vias de internacionalização e conta com a participação de mestrandas, doutorandas e outras pesquisadoras vinculadas a outras instituições de ensino superior, a Fiocruz Piauí e ao Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas – (PPGPP-UFPI), todas nos encontramos atentas de como esta nova realidade mundial pandêmica permeia tal crime. Estamos plenamente satisfeitas por termos recebido tantas reflexões em forma de artigo científico, o que significa que estamos no caminho certo, é preciso investir nosso tempo e energia no estudo, na investigação e na construção de respostas para cessar o feminicídio. Finalizamos aqui, prestando os nossos agradecimentos e dando os parabéns a todas as autoras e os autores que submeteram seus textos para o dossiê “FEMINICÍDIO EM TEMPOS DE COVID-19”, bem como ao editor Antônio Ozaí, por sua gentileza e atenção conosco, estendendo também aos demais da equipe Revista Espaço Acadêmico.

 

Elaine Nascimento

Brenna Galtierrez Fortes Pessoa

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Biografia do Autor

Brenna Galtierrez Fortes Pessoa, Universidade Federal do Piauí

Graduada em Serviço Social. Mestranda do Programa de Políticas Públicas pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Auxiliar em Pesquisa da Fiocruz Piauí.

Elaine Ferreira do Nascimento, Fiocruz Piauí

Doutora em Ciências. Assistente Social. Coordenadora Adjunta da Fiocruz Piauí. Docente do Programa de Políticas Públicas pela  Universidade Federal do Piauí (UFPI).

Referências

não tem
Publicado
2020-09-21
Como Citar
Pessoa, B. G. F., & Nascimento, E. F. do. (2020). Apresentação do dossiê “Feminicídio em tempos de Covid-19”. Revista Espaço Acadêmico, 20(224), 01-03. Recuperado de https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/55577
Seção
DOSSIÊ: Feminicídio em tempos de COVID19