Narciso em férias como experiência estética especular de reconhecimento: Caetano Veloso e seu corpo insubmisso

Palavras-chave: Caetano Veloso; Narciso em férias; Reconhecimento; Experiência estética; Autorrepresentação; Sexualidades dissidentes

Resumo

A partir de uma problematização teórico-epistemológica que articula comunicação e experiência estética, este artigo examina o documentário Narciso em férias. Em perspectiva descritiva, analítica e interpretativa, propõe-se um cotejamento entre o Brasil dos anos 1960 e de 2020. Contextos diferentes que se espelham, a ditadura militar e o governo Bolsonaro, saudosista dos anos de chumbo. Lançado como audiovisual no universo do streaming em 2020, Narciso em férias traz um fato ocorrido em 1968, que já foi retratado em livro impresso em 1997, escrito e agora narrado em frente às câmeras pelo protagonista da história (e deste artigo), Caetano Veloso, que se autointitula um Narciso. Preso pela ditadura, Caetano descobriu, às vésperas do documentário, que seu corpo dissidente foi também motivo alegado para o cárcere, um corpo descrito nos autos dos militares como “desvirilizante”, ou seja, não-másculo, que subverte os limites binários de gênero e as sexualidades normatizadas pelos padrões sociais. Um corpo que, até hoje, com mais de 80 anos de idade, continua a gerar estesia, reconhecimento e resistência.

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Biografia do Autor

Laan Mendes de Barros, Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho" - FAAC-UNESP

Jornalista e editor, possui graduação e licenciatura em Educação Artística e Artes Plásticas pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo (1978), mestrado em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo (1988), doutorado em Ciências da Comunicação pela Universidade de São Paulo (1994) e pós-doutorado na Université Stendhal - Grenoble 3, na França (2008). Atualmente é professor e pesquisador da Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design da Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho" - FAAC-UNESP, com atuação na Graduação e Pós-Graduação. É professor permanente e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UNESP (Mestrado e Doutorado). Na educação superior atua no ensino e na pesquisa em Comunicação Social, com ênfase em Teoria da Comunicação e Metodologia da Pesquisa, trabalhando principalmente com os seguintes temas: epistemologia e teoria da comunicação, comunicação e cultura, comunicação e experiência estética e música e mídia.

Marcos Brogna, Universidade Estadual Paulista (UNESP). Bauru-SP, BR

Doutorando e mestre em Comunicação pela Universidade Estadual Paulista - UNESP. Atua como professor universitário no Centro Universitário Senac Santo Amaro, em São Paulo. Graduado em Jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero, trabalhou 15 anos em redações. É autor do livro "Viva (e entenda) a diferença" pela Editora Senac São Paulo e co-autor da coleção "Integramundo" (Tulipa Editora), aprovada no PNLD 2020.

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Publicado
2024-02-19
Como Citar
Mendes de Barros, L., & Souza Brogna, M. R. (2024). Narciso em férias como experiência estética especular de reconhecimento: Caetano Veloso e seu corpo insubmisso. Dialogos, 27(3), 1-23. https://doi.org/10.4025/dialogos.v27i3.68846