A pesquisa histórica sobre a educação no período da ditadura cívico-militar

à guisa de apresentação e debate

Résumé

A educação foi um dos setores mais impactados pelo regime autoritário instituído em 1964 no Brasil, não somente pela violência, repressão e truculência direcionada a estudantes e professores mas, também, pelos usos que os governos militares fizeram das instituições educacionais e da cultura escolar como instrumento de controle e doutrinação ideológica, além das profundas transformações que imprimiram na estrutura do sistema de ensino com a reforma universitária de 1968 (Lei nº 5.540/68) e a reforma do ensino de 1° e 2° graus (Lei nº 5.692/71), cujas implicações vivemos ainda hoje. O panorama é semelhante, mas não o mesmo, em outros países da América Latina, produto do Plano Condor, que difundiu técnicas governamentais sobre as populações em termos políticos, econômicos e pedagógicos. Um número crescente de pesquisadores tem se debruçado nos últimos anos ao estudo da história da educação no período das ditaduras cívico-militares, interrogando esse período histórico com novas perguntas e a partir de diversas abordagens. Sem dúvida, a renovação do campo da História e da História da Educação tem contribuído enormemente para o alargamento do questionário dos investigadores. A ampliação das fontes de pesquisa, a relação da história com outros campos de saber como a Antropologia, a Psicologia, a Linguística, o olhar para a cultura e as noções de práticas e representações têm fertilizado uma multiplicidade de temas e interpretações (Barros, 2011). Mas o estudo do período da ditadura encerra dificuldades, pois dialoga com o debate político atual e encontra-se imerso nas disputas pela memória. Além disso, está envolto em controvérsias de natureza teórica nos próprios campos disciplinares. O objetivo deste dossiê, ora publicado pela Revista Brasileira de História da Educação, é justamente o de aprofundar o conhecimento sobre o tema e propiciar o debate colocando em questão diferentes análises sobre esse período histórico e suas implicações para a educação.

 

[1]     De acordo com Bauer (2012), a proliferação de memórias particulares e de redefinições de identidades nacionais intensificou-se no final do século XX, com o aparecimento de novas memórias no espaço público derivadas da afirmação de identidades e da busca por reconhecimento de memórias silenciadas. Na França, na década de 1990, surgiu a expressão “dever de memória”, diretamente vinculada à noção de políticas de memória, isto é, “como possibilidade de se reconhecer e reparar episódios traumáticos do passado, como as ditaduras, genocídios, guerras e violações de direitos humanos” (Fernandes, 2022, p. 21).

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Bibliographies de l'auteur

Eduardo Lautaro Galak, Universidad Nacional de La Plata, Buenos Aires, Argentina

Pesquisador do CONICET e professor na UNLP, doutor em Ciências Sociais com pós-doutorado na UFMG. Atua na área de corpo, educação e política, organizou livros e investiga discursos sobre formação profissional, estética, saúde pública e eugenia, destacando a relação entre educação corporal e reprodução política. Editor associado da RBHE.

Elizabeth Figueiredo Sá, Universidade Federal do Mato Grosso, Cuiabá, MT, Brasil

Professora Associada credenciada no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo, com estágio pós-doutoral pela Universidade de São Paulo (2008), Universidade de Uberlândia (2018) e pela Universidade de Coimbra, Portugal (2023).

Rosa Fátima de Souza Chaloba, Universidade Estadual Paulista, Marília, SP, Brasil

Professora Titular credenciada no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus Marília. Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo, com estágio pós-doutoral pela University of Wisconsin, Estados Unidos (2001), e pela Loyola University – Chicago (2025). Pesquisadora do CNPq.

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Publiée
2025-05-01
Comment citer
Galak, E. L., Sá, E. F., & Chaloba, R. F. de S. (2025). A pesquisa histórica sobre a educação no período da ditadura cívico-militar. Revista Brasileira De História Da Educação, 25(1), e367. https://doi.org/10.4025/rbhe.v25.2025.e367