A relação populista-militarista e seus impactos para uma educação democrática
Resumo
Esse artigo discute a relação populista-militarista que estruturou o Governo Bolsonaro e os reflexos disso para a educação, em especial, para o ensino das Ciências Sociais e Humanas dado seu papel no fortalecimento de um projeto democrático e, portanto, oposto a formas de governo desse tipo. Para tanto, toma-se como caso de estudo o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim) o qual prevê a criação de um formato organizacional híbrido, no qual a gestão administrativa e educacional de escolas passa a ser feitas por militares. Para dar conta de responder à questão norteadora dessa pesquisa que indaga sobre o que a representação de atores sociais envolvidos no Pecim revela sobre conteúdos ideológicos legitimados pelo Bolsonarismo e os efeitos práticos disso? Utiliza-se como referencial metodológico a Análise Crítica do Discurso (ACD) desenvolvida por Theo Van Leeuwen (2008) para quem a compreensão sobre os processos de legitimação discursiva pode ser alcançada a partir da forma como os atores sociais são representados textualmente. Sendo que os textos investigados são provenientes de órgãos oficiais do governo, de pessoas diretamente relacionadas ao Pecim e, também, de entrevistas com informantes. Esse estudo traz contribuições em duas grandes frentes considerando os debates atuais. A primeira diz respeito a investigação sobre os conteúdos ideológicos de viés militarista disseminados por governos populistas. A segunda é apresentar sobre as implicações práticas disso no campo educacional. Os resultados dessa pesquisa evidenciam sobre formas de construção discursiva e representacional que enfraquecem o pensamento crítico e que colocam a educação como objeto de senso comum retirando-lhe o status de fazer científico produzido a partir de diferentes áreas do conhecimento.
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